Alterações no âmbito do processo de insolvência

No passado dia 11 de janeiro, foi publicada a Lei n.º 9/2022, que estabelece medidas para apoiar e agilizar os processos de reestruturação de empresas e acordos de pagamento, transpondo para o ordenamento jurídico nacional a Diretiva (EU) 2019/1023.

A Diretiva (EU) 2019/1023 estabelece um conjunto de medidas que pretendem contribuir para uma reestruturação financeira eficiente e justa, criando um quadro legislativo europeu comum que pretende possibilitar uma segunda oportunidade, após o decurso de um período razoável, aos “empresários honestos insolventes ou sobreendividados”.

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A referida Diretiva, nos termos da sua alínea h) do n.º 2 do artigo 1.º, não é aplicável a pessoas singulares que não sejam empresárias, mas o legislador nacional, com a Lei n.º 9/2022 de 11 de janeiro, alterou e estabeleceu medidas concretas que muito contribuirão para que os processos de insolvência de pessoas singulares sejam mais eficientes.

Neste contexto, a alteração legislativa que, provavelmente, terá maior impacto positivo na vida dos insolventes singulares está prevista nos artigos 235.º, 237.º e 239.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa, que altera o atual período de cessão de 5 (cinco) anos, para 3 (três) anos.

De igual modo, com o encerramento do processo de insolvência – isto é, após o encerramento da liquidação de todos os bens e realização do rateio final, quando exista massa insolvente para ser distribuída pelos credores – inicia-se o período de cessão, que agora será de 3 (três) anos, durante o qual o rendimento disponível que o devedor venha a auferir se considera cedido ao fiduciário.

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Decorridos 3 (três) anos, caso se verifique o cumprimento das obrigações, nomeadamente da cessão de rendimentos e não ocultação de património e informações, será concedida a exoneração do passivo restante do devedor, que permite o desejado novo começo, sem o peso das dívidas que foram de impossível cumprimento.

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Outra inovação legislativa de relevo consiste no aditamento do artigo 241.º-A ao Código da Insolvência e da Recuperação de Empresa, que cria a possibilidade de prorrogação do período de cessão, por um período máximo mais 3 (três) anos, mediante requerimento, que deverá ser feito no prazo de 6 meses, desde o conhecimento da situação, fundamentado do devedor, de algum credor ou do fiduciário, caso o devedor tenha violado alguma das obrigações que lhe são impostas pelo artigo 239.º.

Assim, se durante o período normal de cessão de rendimentos, que repete-se agora será de 3 (três) anos, o devedor, por qualquer motivo se veja impossibilitado de cumprir com as suas obrigações, prejudicando com isso a satisfação dos créditos, poderá o juiz, caso entenda que exista possibilidade de cumprimento pela concessão de prazo adicional, prorrogar o prazo de cessão, permitindo assim ao insolvente beneficiar, findo esse prazo adicional, da exoneração do passivo restante.

Em abono de clareza, imagine-se uma situação em que um devedor não entregou ao fiduciário o seu rendimento disponível, estando em incumprimento, o qual não consegue, dentro do prazo normal para o efeito, regularizar.

No regime atual, esta situação resultaria, indubitavelmente, na recusa ou revogação da exoneração do passivo restante. Agora, poderá, por requerimento fundamentado, pedir a prorrogação, pelo prazo máximo 3 (três) anos, findo o qual, tendo cumprido todas as obrigações, verá ser-lhe concedida a exoneração do passivo restante.

Mostra-se também relevante referir que o prazo para os credores e/ou para o fiduciário requererem a cessação antecipada do procedimento de exoneração, que está prevista no artigo 243.º, é reduzido de 1 (um) ano para 6 (seis) meses.

Relativamente aos processos pendentes, o artigo 10.º da Lei n.º 9/2022 de 11 de janeiro prevê, de forma clara, o regime transitório, determinando que a lei é imediatamente aplicável aos processos pendentes na data da sua entrada em vigor, esclarecendo o seu n.º 2, que nos processo de pessoas singulares pendentes em que o período de cessão de rendimentos já dure há 3 (três) anos, considera-se o mesmo findo com a entrada em vigor da lei.

A Lei n.º 9/2022 de 11 de janeiro entra em vigor 90 dias após a sua publicação, isto é em 11 de abril de 2022.

A partir da referida data, não sendo desencadeado oficiosamente, poder-se-á, nos processos em que o período de cessão tenha completado 3 (três) anos, requerer o seu término e concluir o processo de insolvência.